quinta-feira, 6 de agosto de 2009

17ª edição do Festival Paredes de Coura 2009 – 29 e 30 de Julho e 1 e 2 de Agosto

Ground Zero – Recepção ao Campista – 29 de Julho

Com o palco principal ainda interdito ao público neste primeiro dia, teve honras de abertura do festival, no palco after-hours, a banda de Coimbra Sean Riley & the Slowriders. Bruno Simões, Afonso Rodrigues e Filipe Costa apresentaram o segundo e mais recente disco Only Time Will Tell, sucessor de Farewell, com bastante garra e muito bons instrumentais, o que acabou por funcionar como uma boa surpresa ao vivo.

À banda conimbricense que funde o country americano com o blues e o rock seguiram-se os The Strange Boys, quarteto oriundo do Texas e aguardado com muita expectativa. Garage rock, blues e sons mais virados para o psicadelismo foi o que se pôde escutar neste concerto que só pecou por um aspecto: o tom demasiado agudo ou até mesmo esganiçado do vocalista, Ryan Sambol, que mais parecia viver a fase da transição de voz dos 13/14 anos, o que acabou por retirar alguma força à banda. No entanto, foi um bom concerto, com o baterista a dominar completamente as atenções do público devido à sua prestação absolutamente exemplar em palco. Apresentaram o seu disco de estreia, editado já este ano - The Strange Boys…And Girls Club.

O cabeça de cartaz desta noite de recepção ao campista era mesmo o multifacetado instrumentista Patrick Wolf. O artista trocou de indumentária mais do que uma vez ao longo do concerto e conquistou rapidamente o público, principalmente as filas da frente, mesmo junto à grade, onde os fãs se encontravam nitidamente deliciados. Para além da componente performativa do espectáculo, Patrick Wolf não descurou o seu papel de intervenção, tendo demonstrado repúdio pela discriminação e acabando por dedicar The Bachelor a todas as mulheres. O excêntrico músico londrino terminou de forma brilhante o concerto com The Magic Position, deixando todos os fãs de sorriso nos lábios.

A fechar o palco after-hours esteve a dupla da Antena 3, os Bons Rapazes – que é o mesmo que dizer Álvaro Costa e Miguel Quintão, numa actuação que deixou algo a desejar. Se prometeram muito ao abrir o set com Fleet Foxes, cedo desapontaram com o rumo que tomaram – e quando dizemos cedo, falamos do segundo ou terceiro tema que passaram – e que veio depois a provar-se ser talvez a linha orientadora do palco secundário, visto que nos dias posteriores aquele espaço mais parecia a Meca do maximal, ao invés de um espaço after-hours de um festival dito de rock.

Dia 1 – 30 de Julho

Aos australianos Temper Trap seguiu-se a nova coqueluche do indie, os The Pains of Being Pure at Heart. Aguardávamos o concerto com alguma expectativa, não só por admirarmos a caminho algo revivalista da banda pelas sonoridades shoegaze, mas também por termos ouvido dizer que ao vivo eram uma desilusão. E de facto assim o viemos a comprovar. Apesar de muito bons e inovadores em disco, os The Pains of Being Pure at Heart não transmitem qualquer tipo de emoção ao vivo, ou pelo menos uma emoção expressiva, o que acaba por resultar numa actuação bastante aborrecida.

Não com expectativa, mas com alguma ansiedade era como esperávamos o concerto dos britânicos The Horrors, que lançaram em 2009 o seu segundo disco Primary Colours. O quinteto acabou por ocupar praticamente todo o espectáculo na íntegra com os temas do mais recente álbum – com excepção de uma música do primeirinho Strange House, registo de 2007, onde vagueiam mais pelo rock inspirado nos anos 60 e 70. Foi um bom concerto, este dos The Horrors da distorção na guitarra e voz à Ian Curtis, que envolveu o público numa atmosfera mais sombria e introspectiva.

Os muito aguardados em Portugal, Supergrass, seguiram-se aos The Horrors, para o primeiro momento nostalgia pop britânica do Paredes de Coura deste ano. A banda que marcou a geração de 90 tocou quase todos os êxitos, exceptuando – muito estranhamente ou nem tanto – o conhecidíssimo tema Alright, o que deixou muitos fãs algo parecido com o amuado. A registar, a versão que fizeram para os míticos Velvet Underground e o seu Sunday Morning. Os escoceses interagiram com o público de forma bastante positiva e conseguiram envolver o público.

A fechar o palco principal nesta primeira noite estiveram os escoceses Franz Ferdinand. Confessamos que depois do fiasco no Sudoeste do ano passado, em que os vários problemas técnicos iniciais quase conduziram ao fim prematuro do concerto e em que o público nunca chegou a aquecer verdadeiramente, não depositávamos grandes expectativas neste concerto. No entanto, tudo se inverteu nos primeiros dez minutos, em que, das três primeiras músicas, duas eram The Dark of the Matinee e This Fire, o que levou o público ao delírio. Não nos custa afirmar que este foi, sem dúvida, O concerto desta edição do Paredes de Coura, com a banda a gerir com mestria um alinhamento que alternava os êxitos com outros temas também candidatos a esse estatuto (os menos conhecidos do terceiro disco Tonight: Franz Ferdinand), sempre com refrãos orelhudos que faziam saltar o mais tímido ou empedernido dos fãs. Alex Kapranos poderia ter sido mais comunicativo do que foi durante o concerto, no entanto, a verdade é que o público já estava definitivamente conquistado e em delírio desde os primeiros minutos, tendo o momento alto acontecido no encore, quando as cerca de 20 mil pessoas que ali estavam cantaram em uníssono a Michael.

Num saltinho ao palco after-hours, assistimos a um curtinho mas agradável concerto de Chew Lips e depois a um set da dupla Holy Ghost, que nunca chegou a provocar grande emoção, pelo menos para aqueles que não apreciam as sonoridades mais viradas para a electrónica maximal e o house.

Dia 2 – 1 de Agosto de 2009

Seguiram-se os muito aguardados Portugal, The Man, banda do Alasca sediada em Portland, Oregon e cujo nome suscita a maior das curiosidades nos fãs do nosso país (e não só, arriscamos dizer!). Para desilusão de muitos, provavelmente, John Baldwin Gourley, vocalista da banda, explicou-nos em entrevista que o nome de Portugal surgiu não com um propósito mas completamente ao acaso, embora confessem não se arrepender da decisão tomada, visto que nesta estreia em solo nacional foram muito bem recebidos pelo povo que apelidam de caloroso. A pressão de um concerto em Portugal acabou por, talvez, influenciar a sua interacção com o público, tornando os quatro rapazes mais tímidos e virados para a música que estavam a tocar em palco. No entanto, esta pouca comunicação com quem estava no recinto não diminuiu nem prejudicou em nada o belíssimo concerto que nos foi oferecido, resultando estes Portugal, The Man numa das melhores surpresas do festival, para muitos dos que lá andavam.

Mais enérgicos entraram logo os Blood Red Shoes, dupla britânica de formação inversa aos White Stripes e que conta com Laura-Mary Carter na guitarra e Steven Ansell na bateria. Era um concerto para o qual tínhamos algumas expectativas e que, apesar de bom, teve alguns problemas técnicos que talvez tenham resultado para que o concerto nunca chegasse a aquecer verdadeiramente. Falta-lhes, talvez, alguma versatilidade ou extravagância em palco, para que se libertem um pouco do registo gravado em disco. O público, no entanto, pareceu entusiasmado com o espectáculo da dupla que optou por tocar temas de Box of Secrets, único disco que têm editado até à data intercalando com novas músicas, no seguimento do que tem sido feito em concerto mais recentes. I Wish I Was Someone Better ficou para alguns, uma das músicas fortes do festival.

Chegamos ao concerto da canadiana que dá pelo nome artístico de Peaches. É, sem dúvida, um dos candidatos, talvez o vencedor, na nossa opinião, do lugar de segundo melhor concerto do festival deste ano. As razões saltam à vista: a poderosa actuação de Merrill Beth Nisker, que enquanto cantava, nunca deixava de representar, transformando o concerto num autêntico espectáculo performativo. Peaches deu pontapés no ar, trepou pelo palco e saltou para a multidão, sendo prontamente <> pelo público em êxtase, ao mesmo tempo que trocava de roupa constantemente, com uma garra de fazer inveja a qualquer um. Contagiou todos quanto ali estavam com a sua pose provocadora, mesmo aqueles que, como nós, não apreciam por aí além a música desta artista, havendo até quem, aqui e ali, despisse a blusa ou a t-shirt para depois a atirar ao ar.

Neste segundo dia do festival a actuação mais esperada era, sem dúvida, a dos Nine Inch Nails, até porque Trent Reznor & Comp. tinham já anunciado que este era o último concerto que davam em solo nacional. Desde o início da tarde que era já fácil identificar no campismo aqueles que eram os fãs da banda, através da t-shirt que orgulhosamente vestiam com a sigla NIN – e eram muitos, muitos mesmo. Os cartazes espalhados pelo recinto que alertavam para o facto de os americanos usarem frequentemente, nos seus concertos, luzes de strobe, deixavam já antever um espectáculo visualmente muito forte – cenário que efectivamente se veio a comprovar. Estranho que Trent Reznor tivesse deixado a mudez de lado para, em apoteose talvez, comunicar com o público presente (mesmo que muito escassamente), público que, diga-se encheu o recinto e cantou em quase todas as músicas. A banda de rock industrial teve tudo para agradar aos fãs e até talvez aos menos fãs, num concerto que terminou muito bem com a sentida Hurt.

Fechado o palco principal, seguiu-se a visita habitual ao after-hours, no dia mais forte que este registou e tudo muito por culpa dos enérgicos Kap Bambino que levaram o público à loucura completa entre saltos, empurrões e gritos, também eles numa performance desenfreada e poderosa à semelhança da que ocorria em palco. Mais tarde, com os Punks Jump Up, o ambiente arrefeceu um pouco – também literalmente – e a chuva que ao início fez com que todos se concentrassem debaixo da tenda do palco secundário, fez depois com que a maior parte das pessoas desistisse e se fosse embora do recinto.

Dia 3 – 2 de Agosto

Ao concerto de Manel Cruz seguiram-se os espanhóis The Right Ons, concerto que não foi emocionante por aí além, tendo funcionado apenas como um pré-aquecimento para a noite que se seguia. A banda faz um rockzinho que não é inovador, embora por vezes tenha optado por um ritmo mais funky que fez alguns pés abanar, embora não o suficiente para que a maior parte das pessoas se levantasse da relva onde estava sentada para começar a dançar. Foi um espectáculo que não vai ficar na memória de por quem lá passou, embora até tenha sido engraçado.

O grupo que sucedeu aos The Right Ons acabou por ficar registado como outra das agradáveis surpresas desta décima sétima edição de Paredes de Coura – os Howling Bells - embora deixemos a ressalva de que não de forma tão marcante como os Portugal, The Man, por exemplo. A grande força dos australianos estava na figura da sua vocalista, Juanita, que foi sempre extremamente comunicativa durante o concerto, havendo até quem dissesse pelo recinto que parecia querer conquistar e/ou seduzir todo o público masculino que estava em frente ao palco, no anfiteatro natural do festival. O espectáculo demarcou-se do anterior, embora lhes falte ainda algum carisma ou presença para marcar indelevelmente a diferença.

Depois dos Howling Bells deixarem o palco, estava tudo a postos para o segundo momento nostalgia da pop britânica, desta feita, na figura inquestionável que é Jarvis Cocker. Muitos dos presentes estavam ali, nitidamente, menos pela carreira a solo do artista do que pela sua personalidade emblemática enquanto ex-Pulp, banda que marcou uma geração. Muitíssimo comunicativo, Jarvis surgiu em palco com uma forte presença, irradiando carisma e com um sentido de humor no mínimo contagiante. Assim. Conseguiu facilmente conquistar o público, mesmo que os temas que tocou tenham sido exclusivamente retirados dos seus dois discos a solo – que não têm nem de longe nem de perto a magia dos álbuns dos extintos Pulp – havendo momentos em que os fãs cantavam em uníssono algumas músicas ou se deixavam simplesmente envolver pelas fáceis e eficazes baladas de rock a pender para o romântico. Em suma, foi um concerto que correspondeu às expectativas, menos não seria de esperar deste grande senhor britânico que durante o concerto não se coibiu de tentar falar em português por diversas vezes.

A fechar Paredes de Coura no palco principal estiveram os suecos The Hives, concerto que já se sabe de antemão ser sempre enérgico e agitado. Isto, muito pela atitude do vocalista, sempre provocadora e centrada em si mesmo, mas nunca deixando de interagir intensamente com o público, que não parou de saltar durante todo o concerto – e o concerto não foi curtinho. Foi um espectáculo engraçado, embora confessemos que a sua música não seja do nosso especial agrado. Foi um espectáculo em que não fugiram à regra daquilo que já se conhece das suas prestações ao vivo.

No palco secundário esteve a banda rock do Porto, os Sizo e com honras de fechar esta décima sétima edição do festival Paredes de Coura 09, o actor/dj nas horas vagas Nuno Lopes. O artista optou sempre por sons mais maximais, se calhar para ser coerente com a linha orientadora do que até aí tinham sido as actuações no after-hours. Embora por vezes tivesse recorrido aos temas clássicos do rock, estes foram sempre apresentados enquanto remisturas, que mais do que tornar o público saudoso, o irritava. A nível técnico, Nuno Lopes também não esteve na sua melhor forma, deixando-nos saudosos de outros anos, em que o festival fechava deixando-nos a suspirar por mais.

Foi, de forma muito genérica, o festival Paredes de Coura com o cartaz mais fraco de que nos lembramos, também e com toda a certeza pela falta de patrocinador oficial. No entanto, durante estes quatro dias, foi possível assistirmos a alguns concertos que vão para sempre ficar na nossa memória e outros que nos fizeram despertar para bandas a que vamos querer prestar mais atenção no futuro. Paredes de Coura e o anfiteatro natural do recinto do festival continua a ser o cenário ideal para viver momentos memoráveis e assistir aos concertos das bandas das nossas vidas.